Como fomos ensinados a nos odiarmos

Medos, inseguranças e incertezas. Quem nunca se viu preso a uma dessas encruzilhadas da vida? Sentiu-se impotente a tomadas de decisões, foi tomado por um sentimento de incapacidade e repetiu caladamente: Eu não consigo. Eu mesma já me disse em diversos contextos, de esportes a educação, sempre era aquela que não confiava nas próprias capacidades. Por medo ou por autossabotagem, eu repetia essas duras penas e novamente confirmava uma meia verdade, que tomava como absoluta.

Cresci e o medo do incerto nunca se esvaiu. Medo de ser julgada e apedrejada pelas nossas escolhas. Medo de ser lembrada pelas nossas falhas. Medo do adeus que eu nunca fui capaz de dizer. Ou os sentimentos que por medo, fui-me obrigada a soterrar. Os ecos ainda estão em minha cabeça, sussurram como lobos ferozes, como a multidão de juízes da vida alheia.

Crescemos com julgamentos por não entrarmos em um padrão, como se o final deste arco iris vendido jazeria nossa felicidade. Vivemos na ilusão desse pote de ouro imaginado. Cortamos e nos polimos para entrar na maldita forma, a moldar e fechar nossa própria essência.

Vivo esse anacronismo, de ter me fechado e pouco desenvolvido em algumas esferas. Te ter sido ensinada a me odiar pelo que eu era, pelo que eu sou e mais ainda pelo que poderia ter sido. E não o fui.

A mim me ensinaram a odiar o meu próprio corpo, que deveria ser apenas uma casca, usada para externalizar o que tenho por dentro. A sentir que nunca era o bastante,  que nunca era o suficiente. A me culpar por todos o tropeços da vida, e minhas barreiras de pedra. A um sentimentalismo duro, fechado demais. Saíram dali e deixaram a muralha inteira e as ruínas dentro.

E a você, o que lhe ensinaram a odiar em você mesmo?

Contos Aleatórios #3 - Um beijo (im)possível?

Ps: Antes de mais nada, isso é baseado em uma história que não é minha, é de um amigo. Ele relatando um fato somado a minha mente viajante, leva a este pequeno texto.


Um beijo (im)possível?


Em verdade, eu já te observava há muito tempo. Numa época que eu era um moleque, cabeça de vento e perdido em muitos pensamentos. Eu estava aquém e muito além de você. Eu era nada.
A terra, a bailar em seus movimentos ordenados, permitem que anos se passem. Este tempo leva-me embora em sua viagem doida, me lapida e me quebra. Me muda de forma que eu nem me lembraria de quem eu era. Anos, há muitos anos.
Outros pequenos amores passaram; alguns amores curtos com a florada dos ipês, outros longos como noites de inverno e aqueles tão curtos quanto o bater de asas de uma borboleta. Pessoas passaram nessas vias tortas de minha vida e eu me esqueci de você. Por este delta no tempo, eu esqueci do ser inalcançável de minha adolescência.
Mas o tempo gosta de brincar, deixar as mãos do meu destino para um bobo da corte, apenas por diversão. Quer me testar e rir da história. Quer jogar na minha cara o improvável e mostrar que eu não sei de nada.
Após este intervalo, lá estava você. Continuava linda e eu, descrente. Eu? Que chance teria. Por mais que você tentasse me dizer, eu fechava meus olhos a qualquer possibilidade.   Era show, era meu espaço, era meu habitat natural. Nas trocas de bandas, você conversa sobre o universo e tudo mais, abria o leque e tentava falar o máximo possível. Eu porém, ainda desacreditava. Duvidava piamente, achava que era mais um blefe do destino, que curtia muito brincar comigo. "A vida é um jogo" e se tratando de amor, eu sou o perdedor.
A noite foi adentrando-se, aos poucos me convenci que aquele amorico adolescente poderia ser real. Mas eu precisava de apenas uma brecha, um momento eu e você. Momento que nunca surgia. Amigos que não desgrudavam: Percebi que durante o show seria impossível. E se saímos juntos após? Bem que eu queria, mas lá estávamos com amigos em comum, que não nos deram uma única brecha. Não importa, no bar ou no carro, não havia brecha.
Eu peguei em sua mão e  você a segurava. Seu doce toque já dizia a verdade que meus olhos se recusavam a ver. Mas é necessário sentir. Senti que no final, ficou nisso mesmo.  Eu apenas queria alguns poucos minutos a sós. Eu juro! Minha trava não deixou agir antes, minha dificuldade em me ver como alguém apto a você me silenciou. E agora eu só penso nessa noite e no que poderia ter sido e no que poderá ser...

A lua, o mar e o veleiro


Oh, pálido luar sobre o mar!
Guia-me e permita-me navegar
Ir tão, tão longe neste oceano 
Cada pedaço deste plano cartesiano.
Lanço-me ao desconhecido
A resposta provável, contestar
Este jeito duro estabelecido
Esta mentira doce refutar
Não consigo me conter!
Em trevas não devo permanecer,
Véus de ódio, devo despir
Visões concretas, esculpir
Conceda-me tua luz, pálido luar
Pois nada sei e tenho muito a navegar
Nestes mares da vida,
Não quero me desviar
Nestas lágrimas da vida,
Não quero me afogar
Quero continuar...

Ruído


Ouço um desconexo zumbido
Um arquivo totalmente corrompido
Essa multidão, palavras proferir
Mil vozes e incapaz de ouvir
E uma aflição sentir
Tantas vozes, tantos ruídos
Maus pensamentos proferidos
E nesta ausência de filtro
Torna-se um barulho sinistro
Talvez precisa-se os ouvidor tapar
De um tempo para me silenciar
Fazer essas vozes pararem de ecoar
Nesse conjunto de ondas destrutivas
Faço em mim essas únicas assertivas
Não posso negar e nem mentir
Preciso ser capaz de única voz ouvir
...a minha!

A corrente de meu relógio


Os elos de minha corrente
Fecham-se livremente
Cada um é um ciclo fechado
De um tempo já findado
De momento cravado
E de memórias, carregado
Cada ciclo de pessoas relacionadas
De um tempo e amizades formadas
De circunstâncias pelo tempo moldadas
Que pelas andanças da vida levadas
E poucas, bem poucas, guardadas
Tic-tac, o tempo é implacável
Escorre pelas mãos de modo inefável
Tic-tac, gira o ponteiro sem parar
Pois o passado, nada posso mudar
Por mais que deseje-o negar
O que levas na corrente de seu tempo?
O que cativas a ficar, e da corrente não se soltar?
Que esta atrelado no fio de seu viver?
Além desse louco tic-tac a mover?
O que levarás quando a corrente romper?

Pedaço


Há um pedaço em mim que ainda arde
Uma ferida que talvez já seja muito tarde
Que em verdade lhe diz: Covarde!

Há em mim palavras travadas
Ecos de frases duramente gravadas
Ruídos no sinal de comunicação
Ranhuras atreladas a esse tolo coração

Há os versos não ditos
Momentos, que se pudera, reescritos
A pena e o tinteiro deixados de lado
Neste meu poema calado

Sinto uma inquietude
Tome uma atitude!
Veja o problema e sua magnitude
Não permaneça em Solitude!
(Não mais!)

Faça o que deve ser feito
O passado não pode ser perfeito
Pois sentes o gosto amargo do efeito
E ainda contempla no espelho o teu defeito
Eu lhe digo: Sinta-se Satisfeito
Eu espero com esmero
Um novo amor-imperfeito!

A terra




Sou rocha dura, carne crua
Ora sou montanha que alcança o céu
Ora sou areia levada e lançada ao léu

Sou pedra, prata e ouro
Trago comigo único tesouro
A chance de algo novo construir
Sob escombros que eu vou demolir

Moldada pelo tempo, movida pelo vento
Quebrada pelo movimento, pressionada pelo momento
Fui a terra, um dia presa a lembranças
Fui o areia, um dia seca a sentimentos
Fui o barro,compactada pelas andanças
Hoje sou apenas solo. Arejada, planejada
Sou nova, novamente.

Águas de um Ser


Cada pessoa traz dentro de si um oceano
Águas que determinam um humano
Mente rasa, mentes profunda
Razão clara, carne imunda
Pensamento obscuro ou reluzente
Alma fria, ou coração ardente

Prefiro a  profunda
Coleciono ao meu redor
A curiosidade fecunda
Quero te conhecer melhor

Em dias de sol, quero a calmaria
Que paira em nas águas de teu existir
Na tempestade quero ser a companhia
Que por suas ondas possa fluir

Quais águas transbordam em teu viver?
Por qual oceano navega o teu querer
Por favor diga-me, o que teme perder?

Anestesiada


Por pensamentos que vagam em meu ser
Eu continuo calada.
Por vontades além do meu querer,
Me sinto atormentada.
Por essa meu pesado viver
Me sinto quebrada, amaldiçoada

Calo-me, rogo aos céus em busca de respostas
Mas sinto que minhas preces foram depostas
Enquanto anseio por uma saída deste labirinto
Eu lhe digo: acada sorriso, sei que minto
Em meu íntimo, eu sei.

Em meu trem de pensamentos
Crio estes novos tormentos
Todos remendados
Todos reavivados

Coloco-me nesta grande repetição
Onde o pause está quebrado
Vivo esta grande confusão
Onde o retorno é negado

Parque de Diversões

Minha mente gira como um carrossel louco
E gentilmente te convido a girar um pouco
Venha e se perca em meus devaneios
Neste giro, venha sem receios

Meus sonhos voam tão alto, além da vista
Da vista da Roda Gigante, grande saudosista
Donde posso ver o sol beijar a terra
Bem além do topo da serra

Minha vida oscila nessa Montanha
Montanha russa, sigo nesta façanha
Entre altos e baixos, entre suspiros e arrepios
Entre eu e mim, entre términos e princípios

E no castelo do terror
Peço-lhe por favor,
Não soltes minha mão!


Contos Aleatórios #2 A Garota Quebrada



Esta era uma garota que perfeitamente poderia ser eu ou você que lê este texto. Pedaços de sua história podem refletir a nossa própria realidade, e parte de sua sina poderia ser a minha. Esta é a a garota quebrada, de sonhos perdidos e despedaçados... De mente frágil, olhar moribundo e fala sufocada.

Desde ao nascer, a garota-quebrada foi instruída a como agir, como pensar e como falar. Não questione as regras do jogo, elas existem antes de mim, antes de você e de muitos outros: Jamais questione! Seja uma princesa! Acredite em contos de fadas, que o mundo é totalmente belo e tingido pelas cores da sua aquarela. Você escolhe como seu mundo será! Entre tules e tutus, seja a bailarina: dance com a graça e a leveza esperada. "Seja graciosa". Siga o manual a risca. Você está me ouvindo? O mundo é seu e se curvará a você.

E a menina quebrada começou a crescer, logo trocou deixou as bonecas para trás. Com o tempo ela percebeu que o mundo não é aquele arco-íris que com tanto zelo, coloriu. Percebeu a ditadura que lhe impuseram: Veladamente manipularam o que falar, sentir e o que vestir. Sentiu-se cativa e amordaçada. Sentiu-se só. Tão sozinha que ninguém se importava com suas lágrimas. Tão sozinha que poderia gritar e ninguém ouviria. Afinal quem se importa com cacos?

 O espelho, este cruel juiz refletindo de forma clara o que você é e como deveria deixar de ser. Criador de sentenças em mentes fracas. Causador de parte de seu tormento.

Ela sonhou em voar e um dia ser ela mesma, afinal esta é a vida dela e que ela estava apta a escolher o que fazer daqui para frente; novamente teve seus sonhos quebrados. QUEBRADOS.

Em uma unica noite, foi estraçalhada de modo irreparável. Viu seu sonho tornar-se pesadelo. Naquela noite ela não pode ver o brilho das estrelas. Naquela noite só pode sentir a dor, a vergonha e o medo. Tornou-se tão quebrada como jamais imaginou e num sopro de esperança, colheu os restos do que um dia já foi.

Aos pés das árvores


Esgueirar-me sob tuas folhas
Eu, ser preso às minhas escolhas
Esta brisa suave a me tocar
E as minhas lágrimas secar

Estas folhas secas a cair
Neste universo coexistir
Como estrelas a surgir
Como vidas a sumir

Tempo escorre, tempo transborda
Tempo voa, tempo para fora
Fora de nosso poder
E continua a escorrer

Vida efêmera, vida breve
vida que não se esquece
Vida bela, minha aquarela
Que se completa

"E num piscar de olhos tudo se findará
Pois a poeira de estrelas vamos retornar
Tudo é um, Um é tudo e sempre será
Reiniciar, Recriar, Recomeçar..!"



A doce sutileza do ser

Há aqueles que usam das palavras
versos e falas quebradas
perdidos em sua loucura
Há aqueles que usam da voz
Em doces melodias, será meu algoz
Por entre notas da partitura
Cante, com ternura
Há aqueles que usam dos dedos
Pinceladas sutis, afugentam medos
Riscos precisos, linhas que ganham vida
Há aqueles que usam a lente
Olhos atentos, perfeitamente
O momento perfeito, prontamente
Há aqueles que usam o corpo
Gestos dizem mais que palavras
A voz, sem áudio
Mas há aqueles que usam do sorriso
Um gesto singelo, porém te aviso
Pode cativar-te para todo o sempre

Sereia



Com mil tons de tinta, o mar floreia
Escreve teus versos ao léu, na areia
Teu cabelo vermelho, na noite é lareira
A água, com tua cauda, perneia
Com um sorriso, o céu clareia
Ser-ei-a!

Contos Aleatórios #1

Um Conto escrito a Lágrimas e Sangue



E no canto da cela, curvado e repetindo as mesmas frases de sempre com seu olhar moribundo e penetrante, lá estava ele. “Venha, precisamos conversar” e o homem permaneceu em seu movimento de vai e vem assíncrono, seus olhos eram como o mar aberto em dia de tempestade: te cativa, te faz lançar-se ao mar para no fim te naufragar em sua mente doentia.
Indago-o sem resposta e o homem continuava em seu movimento perpétuo, como um pêndulo a deslizar grosseiramente, para lá e para cá. Este homem, que em tempos atrás, você partiria tranquilamente da premissa de sua total sanidade, não aparentava ter nenhum comportamento violento. Seria chamada de “homem de bem”, “homem honesto” e “homem correto”, entretanto nunca aprendeu o real sentindo do amor e sua forma cadenciada de desapego. Era daqueles que se escondiam na faceta de bom moço, mas em verdade era extremamente inseguro e escondia todos os medos na forma de possessão. Vivia um amor doentio, abusivo por essência e atribuía a sua carência a sua total falta de noção. “Eu tenho medo da solidão”, era o maior dos males que ecoava em sua mente. “Por favor, não me deixe” “Eu prometo que daqui para frente, tudo será diferente”. A dor da perda não era algo que ele aceitaria, sentir que já não estava no controle da situação, tão menos.
Seu vazio era preenchido por uma garota mais iluminada que a luz da lua cheia, capaz de levar luz a sua mente perdida. Ela era o conforto, alegria e tudo que ele precisava ter. Mas um dia ela quis ir. Ir embora, pois não era capaz de suportar a pressão desse relacionamento destrutivo. Não aguentava ter sua liberdade drenada, não aguentava ter seu sorriso domado e sua vida controlada. Um dia ela simplesmente cansou-se e foi embora.
Até um dia, havia sangue nas mãos do homem, a dor da perda de um amor tornou-se a perda de sua liberdade e consciência, selado a sangue estava seu destino. A falta de compreensão do que é o amor o levou a um comportamento doentio, que minou e fez sangrar seu raio de luz. A lembrança do momento de fúria retorna como navalha, o corta todos os dias, viu aquele rosto meio com uma expressão de pavor e suas mãos algemadas. Uma forma bizarra de amar, uma forma doentia de amar. O destino de ambos, selado.
“Os vizinhos relataram constantes brigas” “Ouviram gritos” “Chamaram a polícia”. Tarde demais para a pobre garota. Tarde demais.